Qual sua cena de amor preferida na literatura?
A minha é de Hemingway, em Por Quem os Sinos Dobram. Uma despedida. Robert Jordan dá adeus a Maria. Ele é um americano que foi combater pela liberdade na Espanha, na Guerra Civil dos anos 30, e ela é uma espanhola simples, jovem. Apaixonam-se, mas guerra é duro.
Jordan se sacrifica por Maria. Ferido, não pode fugir a um cerco dos inimigos. Maria pode. Ele a convence a ir dizendo que ele viveria nela. Jordan morre para que Maria viva e, com ela, o amor deles e, em certa medida, os planos que fizeram juntos para o futuro.
(Maria deve ter-se apaixonado depois por homens bem menos interessantes que ele, mas isso é tema para uma especulação quem sabe em outro texto. Ali ela é de Jordan e de mais nenhum outro homem.)
Hemingway foi intensamente viril na prosa e na vida, mas escreveu páginas românticas e sentimentais como se fosse um poeta daqueles que morriam de tuberculose, envolvidos em cachecóis e tossindo sangue delicadamente.
Ele se deu um tiro na boca quando cansou de viver. Fez como Sêneca diz que o homem deve fazer quando a vida vira um fardo: saiu dela, sem choro e sem lamentações. Já não podia fazer tudo aquilo que o fascinava: caçar, pescar, fornicar. Nem escrever mais conseguia, prejudicado por uma arteriosclerose.
Bateu em retirada.
Deixou imitadores, seguidores, contos notáveis escritos numa linguagem extraordinariamente enxuta, alguns romances de alto nível, uma vida vivida com volúpia — e também aquela que é para mim a melhor cena de amor da literatura.