Um jovem escritor, em busca por inspiração, começa a seguir pessoas desconhecidas pelas ruas e acaba conhecendo um ladrão. Essa é a sinopse de um filme em preto e branco, de 1998. Com um orçamento de apenas 6 mil dólares, e filmado durantes os finais de semana de um ano inteiro, Following fez Hollywood abrir o olho para um novo e promissor cineasta de apenas 28 anos. Era o inglês Christopher Nolan, que já havia dirigido três curtas-metragens e mostrava que conhecia muito bem a Sétima Arte.
Um jovem escritor, com bastante inspiração, Christopher Nolan é, hoje em dia, um dos diretores mais bem sucedidos de Hollywood. Em termos de bilheteria, já é um dos 10 maiores da história. Como produtor, também, sua carreira é invejável, comandando a ressurreição dos dois maiores ícones da DC Comics. Mas talvez seja mesmo como escritor, ou melhor, roteirista, que seu talento vem à tona.
Insônia (Insomnia, 2002) tem seu nome apenas na direção e é, depois de Following, seu filme menos famoso e menos cultuado. Apenas A Origem (Inception, 2010) é uma obra originalmente sua. Mas Nolan tem uma espécie de toque de Midas. O roteiro onde coloca a mão vira ouro, ganha uma complexidade e uma profundidade incomuns em blockbusters.
Em Amnésia (Memento, 2000), o cineasta usou uma história criada por seu irmão Jonathan (que viria a se tornar um parceiro habitual em escrita, além do criador da série Person of Interest) para fazer um filme notavelmente inteligente e com uma cronologia bastante diferente do comum. Capaz de surpreender o público e de ganhar cada vez mais fãs, este belo cartão-de-visitas para a crítica ainda conseguiu duas indicações ao Oscar, nas categorias de Roteiro e de Montagem.
De maneira parecida, mas com orçamentos bem maiores e sem brincar tanto com a cronologia, Christopher Nolan criou mais duas obras daquelas que melhoram a cada nova visita. A cada vez que se assiste ao filme, descobre-se novas informações que fazem com que tudo ganhe ainda mais sentido. O Grande Truque (The Prestige, 2006) é um excepcional e obsessivo duelo de ilusionismo e enganação que acaba envolvendo também o público nesse jogo. Já A Origem é uma complexa e original ficção científica, uma raridade entre filmes que não são adaptações, continuações ou refilmagens.
Mas foi com a Trilogia Batman (Batman Begins, 2005 / The Dark Knight, 2008 / The Dark Knight Rises, 2012) que ele mostrou seu poder. Tentando revitalizar uma franquia falida após o Batman & Robin (1997) de Joel Schumacher, que mais parecia uma paródia de filmes de super-heróis, Nolan decidiu pautar este recomeço no realismo – ou “realismo pós-Bourne”, uma tendência dos filmes de ação de Hollywood, após o sucesso da Trilogia Bourne.
Completamente diferente dos filmes de Tim Burton, esse novo Batman colocou dilemas muito mais profundos, vilões muito mais humanizados, e um Christian Bale inspirado. Conseguiu seu auge no sombrio Batman – O Cavaleiro das Trevas que, com um Coringa histórico e a consagração póstuma de Heath Ledger, ousou passar e muito a barreira dos “filmes de super-heróis”, chegando até gêneros mais distantes como “thriller psicológico”.
Como diretor, Nolan é um conservador. Na batalha entre película e digital, ele prefere a primeira opção. E quanto mais película, melhor (35mm, 65mm, 65mm deitado). Quando possível, prefere realizar os efeitos visuais em frente das câmeras, em vez de fazê-lo na pós-produção. Não usa segunda unidade, que é quando, grosso modo, outra equipe, com outro diretor, fica responsável por filmar cenas menores do filme. E já recusou, mais de uma vez, filmar em ou converter seus filmes para o 3D. Já como roteirista, é um dos mais ousados do gênero “ação”, subvertendo conceitos e conseguindo surpreender de diversas maneiras. Sim, ele é um diretor talentosíssimo, mas é um roteirista ainda melhor.
E é escrevendo que pretende reerguer outro super-herói desgastado no cinema. Além de produzir, Nolan também ajudou a criar o recomeço do Super-Homem, em O Homem de Aço (Man of Steel, 2013). Claro que o apuro visual de Zack Snyder para cenas de ação é outro grande atrativo, mas a criatividade e a supervisão de Nolan podem funcionar como um selo de garantia. E é o máximo que podemos ter dele, enquanto não lança sua ficção científica espacial Interstellar.
Um jovem escritor, em busca por inspiração, começa a seguir pessoas desconhecidas pelas ruas e acaba conhecendo um ladrão. Bem, se, por acaso, em seu longa-metragem de estreia, Christopher Nolan tiver feito uma espécie de autobiografia, então os cinéfilos devem muito a esse ladrão que inspirou um jovem inglês a ganhar o mundo.
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