Ciclista do cotidiano. Gostei desse termo — soa bem e descreve exatamente o que eu quero dizer. O termo não está na moda, mas a prática sim. Hoje cada vez mais adota-se a bicicleta em uso cotidiano, como meio de transporte.
Mas muitas pessoas, apesar do desejo, ainda demonstram receios em se tornar um ciclista do cotidiano.
Eu sou um. Há pouco mais de 7 anos pedalo diariamente em São Paulo, usando a bike como meu veículo rotineiro.
E como gostaria que você fosse também, resolvi te contar como é a vida de um ciclista do cotidiano — os desafios, as maravilhas, os hábitos e seus pensamentos — em 11 fatos.
Acho que depois disso sua votande só vai aumentar. Pelo menos espero que assim seja…
Sabe aquele negócio de ter que considerar o horário para saber se está muito trânsito ou não na hora de ir para um compromisso? Isso não existe para o ciclista do cotidiano.
Para ele, pedalar as seis da tarde ou as quatro da manhã dá na mesma em termos de tempo de viagem. O trânsito pouco influencia em seu caminho — ainda mais com tantas ciclovias na cidade.
O ciclista do cotidiano sabe quase que com prefeição matemática quanto tempo demorará para chegar em seu destino. E isso facilita muito a sua vida.
Isso vai depender um pouco do quanto que o ciclista pedala por dia. Mas uma coisa é fato: quem pedala diariamente tem um bom condicionamento físico.
O ciclista do cotidiano não vê a pedalada como um esporte, mas como locomoção, então ele esquece que, sim, é um atleta, ainda que bem amador.
É tipo assim: ele vai jogar futebol e inesperadamente percebe que corre muito mais do que todo mundo; ele olha para a perna e pensa, “ué, de onde saiu essa definição?”; ele sobe um lance de escadas grandes sem ficar ofegante.
Só que isso também pode causar problemas, porque geralmente o ciclista do cotidiano não se cuida como um esportista. Exemplo básico é a alimentação — ele mantém os mesmos hábitos de quando não era ciclista.
O ciclista do cotidiano é muito feliz. Mas às vezes precisa entrar num carro para se lembrar disso. Quando ele pega uma carona e fica uma hora parado no mesmo lugar, olha para a ciclovia ao lado, vê as bicicletas passando, sorri instintivamente e pensa: “Como eu sou feliz!”
Ele também sente um prazer secreto (e meio sacana) ao passar no meio dos carros em um engarrafamento gigantesco. É o sentimento de liberdade em uma de suas expressões mais claras!
Quando o ciclista do cotidiano se depara com uma nova ciclovia a sua frente, ele entra em êxtase imediatamente. É tipo a visão do oasis ao beduíno. Ele se regozija com cada metro percorrido, afinal, é indicativo de mais um trecho de pedaladas tranquilas.
É comum o ciclista do cotidiano passar mais do que uma hora por dia pedalando. Só que esse tempo não é útil apenas para o corpo — mas também para a cabeça.
Ele utiliza o tempo da pedalada para pensar na vida: planos para o trabalho; como resolver alguma DR que está se estendendo há meses; o que vai fazer para o jantar. E por aí vai…
Quando o ciclista do cotidiano se sente alvo de alguma manobra ousada de um carro ele fica puto da vida. Ele torce para que o próximo farol feche rápido, assim pode chegar na janela do motorista e falar tudo o que pensa.
É natural, porque quando isso acontece ele sente sua vida nas mãos da imprudência alheia.
Mas o ciclista do cotidiano não deveria fazer isso, porque, ainda que tenha razão, quando faz o motorista acha que ele é folgado e vai pegar birra dele e de todos seus amigos pedaleiros.
Infeliz realidade!
As cidades no Brasil ainda não têm estrutura ideal para acolher quem pedala. Então o ciclista do cotidiano tem que se virar como dá. Ele não pode ter vergonha. Onde quer que vá já tem o discurso na ponta da língua: “Tem um lugar onde eu possa deixar a bike com segurança?”. Dificilmente ele encontra bicicletários (e quando encontra é uma alegria!).
Fora isso, o ciclista do cotidiano já prevê a questão da vestimenta. Sempre. Pedalar de calça jeans, camisa e etc é um saco. Ele geralmente está com roupa esportiva.
Então se vai para um bar, já calcula como colocará a roupa formal. Às vezes ele entra mulambento no recinto, com a cara e com a coragem, e vai até o banheiro se trocar. Mas se o lugar exige mais discrição, é obrigado a encontrar outra estratégia no meio do caminho para fazer isso.
Sim, o ciclista do cotidiano tem preguiça! Não dos traçados que fazem parte da sua rotina. Seu caminho da roça pode percorrer 50 km, mas, como é rotina, ele não terá preguiça disso.
Agora fazer um traçado longo, com muita subida, que não está previsto na sua agenda cotidiana dá preguiça.
Às vezes ele encara. Às vezes ele opta pelo transporte público. Às vezes ele vai de carro.
O ciclista do cotidiano gosta muito da sua bicicleta. Ela não é um objeto — mas uma entidade com vida própria. Ou algo assim. Ele pode negar, mas secretamente ela tem até um nome.
E não é magrela!
As pessoas costumam fazer grande caso sobre andar de bicicleta. Ainda mais hoje em dia, com a prática na moda. Mas para o ciclista do cotidiano andar de bike não é nada demais.
Pedalar 10, 15, 20 km para ele não é algo digno de nota, pois é rotineiro. Enfrentar chuva é algo comum e não merece exclamações. Sair no frio, ir para o bar de bike, pedalar de madrugada são situações normais.
Quando num dia gelado e chuvoso alguém pergunta: “Você não veio de bicicleta hoje, né!?”, ele responde educadamente que sim — mas internamente questiona de volta: “Por que não viria?”
O ciclista do cotidiano é besta. De verdade mesmo ele não se sente heroi coisa nenhuma. Mas as pessoas fazem ele acreditar nisso com reações do tipo: “Nossa, você faz tudo de bike?”, “Você vai até lá de bicicleta a essa hora?”, “Que homem corajoso!” e blá, blá, blá.
Então, como ser falível e orgulhoso, ele aceita as admirações e se vê como o super ciclista do cotidiano.
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E você, quer ser um também? Ótimo! Leia esses outros dois textos para se inspirar mais ainda:
Sim, você pode ser um ciclista do cotidiano — é mais fácil do que pensa
13 dicas para pedalar numa cidade grande
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