A primeira orientação que recebemos quando vamos iniciar na corrida é de procurar um tênis adequado às nossas características, assim evitamos lesões desnecessárias.
No entanto, diversos estudos já foram realizados para contra-argumentar esse paradigma. Nesse daqui, de 2003, os pesquisadores demonstram que tênis diferentes, de tecnologias diferentes, provocam impactos similares em nosso corpo. E nesse outro, de 1998, foi revelado que tanto em calçados duros quanto em calçados moles o pico de impacto foi similar, apesar da solicitação muscular ter sido diferente. Ou seja, a diferença apenas ocorre numa transferência de forças.
Existe ainda uma crescente força no mundo das pesquisas e da prática desse esporte que valorizam a corrida sem tênis (também conhecida como “barefoot running”) ou, ao menos, com algum equipamento que forneça o menor amortecimento possível. A alegação para defender essa ideia é que o ser humano não foi feito para correr de tênis e que só depois de muito tempo em que começamos a correr é que foi inventado o sapato.
Isso é verdade. Mas se optarmos por adequar nossa corrida a esse tipo de técnica, é preciso analisar com muita calma como acontecerá essa transição e, principalmente, lembrar que devem existir alterações na postura e biomecânica da corrida para que seja possível se exercitar utilizando os tênis minimalistas (que trazem pouca tecnologia de correção de pisada).
Considerando esse ponto de vista, penso que podemos concluir que aquele tênis com incontáveis molas e amortecimento de 20 centímetros pode não ser o ideal para você começar a correr, não é verdade?
É importante ressaltar, porém, que se você corre com tênis que carregam grande tecnologia há muito tempo, seu corpo provavelmente está adaptado àquilo que eles oferecem (lembrando que, além do amortecimento, os calçados promovem uma proteção ao seus pés). No entanto, é importante ficar claro que a quantidade de amortecimento que um tênis promove não é um indicador seguro de que ele seja melhor do que outros, ou de que ele seja ideal para você.
Existem, basicamente, 5 tipos de pisadas: muito pronada, pronada, neutra, supinada, muito supinada. Mas vamos sempre utilizar as três principais, pronada, neutra e supinada, pois, se você possuí uma pisada em um dos extremos deve procurar um médico e um treinador, afinal, essa condição ortopédica te levará a ter problemas articulares no joelho e coluna mesmo que você não corra.
A questão de que o tênis tem que estar adequado à sua pisada está altamente associada ao marketing das empresas. Como falamos, é verdade que existe uma tecnologia por trás do desenvolvimento de cada calçado que busca, na verdade, “corrigir” de maneira artificial algo que seu corpo não está fazendo corretamente (ou então, que não está fortalecido o suficiente para realizar de maneira adequada).
Quando pensamos, por exemplo, em um tornozelo que não possuí muita estabilidade, é possível utilizar tênis com características estabilizadoras para não judiar essa articulação. Mas é perfeitamente possível, também, realizar exercícios de fortalecimento e equilíbrio para ajudar nessa questão.
Um estudo realizado no ano passado colocou atletas amadores, cada um com um tipo de pisada diferente, para correr com um tênis neutro. Em teoria, quem é pronador deve correr com um tênis para pisada pronada e quem é supinador deve correr com um tênis para pisada supinada. No entanto, a pesquisa demonstrou que não houve risco aumentado para nenhum corredor, ainda que o tênis não fosse o ideal para suas pisadas.
Ou seja, é sim possível realizar corrida com tênis minimalistas ou até o barefoot running se você tomar as providências necessárias e manter um acompanhamento profissional. O que não pode é sair trocando de técnica de corrida e de equipamento sem ter o preparo mínimo para isso. O tipo de corrida ideal vai variar de pessoa para pessoa, pois as condições do organismo de cada um e os objetivos com o esporte são muito diferentes.
Sendo assim, na hora de comprar seu tênis de corrida considere suas condições orgânicas e suas metas. Procure experimentar o calçado na loja. Ande um pouco com ele, sinta-o, veja se demonstra algum tipo de propensão a desequilibrar seu pé. Perceba se é leve e confortável. Por fim, não se esqueça de que é o tênis que tem que se adaptar a você – e não você a ele.