Após muitas dúvidas dos leitores sobre corrida e hipertrofia expostas no texto Corrida Atrapalha a Hipertrofia?, resolvemos fazer um artigo com algumas informações a mais.
O trabalho aeróbico influencia sim no processo de hipertrofia (e vice e versa) e iremos ver agora as diferente possibilidades disso acontecer.
A fim de dar mais respaldo às informações, o artigo será baseado em alguns estudos científicos e citaremos as respectivas fontes.
Para desenvolver as ideias usaremos 3 nomenclaturas:
- TA: treinamento de aeróbio/corrida
- TF: treinamento de força/hipertrofia
- TC: treinamento concorrente (TA+TF)
EXCESSO DE TREINO
Hickson R.C. realizou um estudo em 1980 em que observou três grupos treinando por 10 semanas. Os grupos TF e TC obtiveram aumento de força, mas após a 8ª semana houve um platô (estagnação nos ganhos) e redução de força no grupo TC.
Isso originou a hipótese do overtraining, ou seja, dependendo do volume, intensidade e frequência, as atividades podem impactar mais ou menos uma na outra. Se não estiverem em perfeita sincronia há a real possibilidade de influenciar negativamente nos resultados do treino.
Essa hipótese ganhou força quando Bell J.F. publicou esse trabalho em 1997 no qual utilizou uma frequência de TC de 3 vezes por semana e não ocorreu efeito negativo nos ganhos de força. Nesse sentido, outras pesquisas (McCarthy et al., 1995; McCarthy et al., 2002; Sale et al., 1990) demonstraram que o treino de musculação + atividade aeróbica nessa frequência não é suficiente para que haja uma interferência no desempenho da força.
Agora, você, meu caro amigo mortal, que trabalha 8-10 horas por dia, tem uma vida estressante e come mal, a chance de sofrer com o excesso de treinamento é maior ainda.
Para evitar ter de lidar com esse fator, procure limitar sua prática de exercícios a 1-1h15m por dia, incluindo aquecimentos e alongamentos.
Caso tenha tempo, você pode optar por dividir a sessão de treinamento, fazendo preferencialmente musculação de manhã (30-45 minutos) e aeróbio à noite (30-45 minutos), se for possível com um intervalo de no mínimo 6 horas entre os treinos.
CARACTERÍSTICAS PESSOAIS
Como sempre, a individualidade é fundamental para dizer se um treinamento vai ou não influenciar no outro.
Dudley e Djamil (1985) e Hunter et al. (1987) demonstraram que um grupo de corredores de longa distância destreinados em força não sofreram efeito negativos do TC quando realizaram esse treinamento 3 vezes por semana. Já com um grupo de sedentários a mesma rotina teve efeitos diferentes e o treino aeróbio atrapalhou os resultados da hipertrofia.
Ou seja, não adianta uma pessoa sedentária querer se tornar um atleta de uma hora para outra. É necessário realizar uma progressão no volume do treinamento. Apenas iniciar a pratica exercícios já é o suficiente para poder observar resultados.
Penso que aumentar um treinamento por semana a cada mês por mês (por exemplo, no 1º mês se exercitar três vezes por semana e no 2º quatro) seja o ideal.
É preciso destacar também que algumas pessoas simplesmente têm grande potencial genético para diferentes atividades e isso com certeza influência no rendimento e recuperação. Alguns têm melhor capacidade de recuperação e conseguem treinar com mais intensidade e frequência. Portanto, como falamos antes, os resultados e planejamentos também são muito influenciados pelos aspectos individuais da fisiologia de cada pessoa.
ORDEM DO TREINAMENTO
Collins e Snow procuraram verificar se a ordem das sessões interferiria no desenvolvimento da força ou da resistência aeróbica. Os autores estruturaram um protocolo de treinamento de 3 vezes por semana, no qual um grupo fazia um TF seguido de um TA e o outro grupo fazia o contrário.
Os resultados revelaram que ambos os grupos não apresentaram diferenças estatísticas no desempenho da força e da resistência aeróbia, concluindo que a ordem dos exercícios não influência no desenvolvimento da força ou da resistência aeróbia.
Ainda assim, muitos autores contestam esses resultados, afirmando que existem evidências que demonstram que o efeito agudo do exercício aeróbio pode inibir a qualidade do treinamento nos exercícios de força aplicados subsequentemente (Abernethy, 1993; Craig et al., 1991; Leveritt & Abernethy, 1999).
Leveritt et al.(1999) consegue sintetizar bem o TC ao pesquisar diferentes abordagens do TF e do TA. Em resumo, podemos dizer que a relação em que ambos são prescritos afeta diretamente o resultado: a atividade que você faz primeiro é a mais beneficiada, apesar de sofrer um impacto negativo ocasionado pela segunda atividade.
NUTRIÇÃO
Apesar desse ponto ser bem lógico, muitos não dão a devida atenção. Quanto mais nutrientes temos entrando em nosso corpo, melhor será nossa recuperação pós treino.
Mas vamos considerar um grupo que quer emagrecer e quer fazer um treinamento de musculação + aeróbio. Esses caras terão que ingerir menos energia do que gastam para alcançar o objetivo de emagrecimento- mas, ao agir dessa forma, a recuperação estará prejudicada.
Por essa razão, esse é pior momento para fazer a transição de 5 treinos de musculação por semana para 10 treinos (5 TAs e 5 TFs).
A melhor alternativa seria reduzir ou a frequência do TF (para 2 ou 3 por semana) e incluir o TA, ou reduzir o volume do TF (por exemplo, de 8 exercício por treinamento para 4-5 exercícios) e incluir aeróbio restante do treino.
COMO COMBINAR OS TREINAMENTOS
Vamos fazer essas combinações de acordo com as prioridades.
- Ganho massa muscular
Se você quer ganhar massa muscular deve praticar o mínimo possível de corrida. De preferência no máximo 2 vezes por semana, algo como uma frequência de:
- Musculação treino A
- Musculação treino B
- Corrida
- Musculação treino A
- Musculação treino B
- Corrida
E o treino de pernas deve ser preferencialmente o A.
Nutrição: tomar especial cuidado para não ficar com déficit calórico. É necessário ajustar sua ingestão alimentar de acordo com o que irá treinar, musculação ou corrida (que possuem gastos energéticos diferentes).
- Emagrecimento (para pessoas com sobrepeso ou obesidade)
Se você quer perder peso deve focar em manter a qualidade do que já vinha praticando. Se já praticava musculação, pode diminuir o volume do treinamento para conseguir incluir os exercícios aeróbios.
Se era sedentário, sugiro que comece lentamente com a prática ou de corrida ou de musculação, e ao longo dos meses inclua mais dias e/ou sessões de treinamento.
Uma dica é procurar aumentar seu gasto energético de forma geral. Para isso, procure aumentar a frequência das atividades que não estão relacionadas ao treinamento, como andar a pé, por exemplo, que, apesar de gastar pouca energia, a longo prazo pode fazer grande diferença.
Nutrição: esse é o principal fator para quem quer emagrecer. Deve-se manter um déficit calórico, principalmente pensando no gasto semanal e não somente no dia a dia. Ou seja, não pode extrapolar no fim de semana.
- Definição Muscular (manter massa muscular e perder gordura)
Se você quer definir tem que focar no treinamento de musculação e manutenção da massa magra. O treinamento aeróbio vai complementar a rotina. Por isso, não adianta querer alcançar um déficit calórico gigante com o exercício aeróbio.
Procure separar os treinamentos aeróbios no mesmo modelo do treinamento para ganho de massa muscular, ou escolha alguns dias para fazer aeróbio pós-treino ou em outro momento.
Nutrição: esse também é o principal ponto aqui. Deve-se manter um déficit calórico, mas não exagerado, pois isso pode levar à perda de massa magra. Procure realizar uma perda gradual, principalmente pensando no gasto semanal e não somente no dia a dia, o que também significa que não pode extrapolar no fim de semana.
- Performance na corrida
Se você é corredor, deve sempre priorizar essa prática, correndo 3-4 vezes por semana. Sugiro um trabalho em que você alterne o tipo de corrida – dias de corridas longas, dias de tiros e dias de medição de performance (por exemplo, 5km o mais rápido possível). A musculação entra como complemento e você deve fazer um trabalho focado na reabilitação e prevenção de lesões.
Importantíssimo ressaltas que as observações nutricionais são apenas um referencial. Para ter mais segurança nessas informações, que são essenciais, é preciso consultar um nutricionista.