Vinte anos atrás, os novatos diretores Peter e Bobby estavam prestes a assinar um contrato de 700 mil dólares com um comediante desconhecido do grande público para que protagonizasse o primeiro longa dos irmãos. Mas outro filme estrelado pelo jovem estreou e tornou-se um grande sucesso, fazendo com que o contrato subisse para 7 milhões de dólares.
A pedido desse recém-astro, os diretores foram atrás de um ator com carreira já consolidada, mesmo que não fosse uma grande estrela de Hollywood. Os irmãos ofereceram a ele 50 mil dólares, esperando que a proposta fosse recusada. Mas ele aceitou sem nem tentar renegociar.
Os diretores são os irmãos Farrelly, o comediante é Jim Carrey, o primeiro longa deles é Debi & Lóide: Dois Idiotas em Apuros (Dumb and Dumber, 1994), o outro filme é Ace Ventura – Um Detetive Diferente (Ace Ventura: Pet Detective, 1994) e o outro ator é Jeff Daniels.
Nos anos seguintes a essa estreia de grande sucesso, os diretores consolidaram-se como dois grandes nomes da comédia hollywoodiana, fazendo longas como Quem Vai Ficar Com Mary? (There’s Something About Mary, 1998), Eu, Eu Mesmo e Irene (Me, Myself & Irene, 2000) e O Amor É Cego (Shallow Hal, 2001).
Já Jeff Daniels era um ator famoso por seus papéis em filmes como Laços de Ternura (Terms of Endearment, 1983) e Aracnofobia (Arachnophobia, 1990), além de suas indicações ao Globo de Ouro por A Rosa Púrpura do Cairo (The Purple Rose of Cairo, 1985) e Totalmente Selvagem (Something Wild, 1986).
E Jim Carrey havia acabado de ser alçado à categoria de mais nova estrela de Hollywood, ao protagonizar o sucesso Ace Ventura. O que só se confirmou ainda mais nos meses seguintes, com os lançamentos de O Máskara (The Mask, 1994) e Debi & Lóide.
Carrey conseguiu a proeza de estrelar 3 números um de bilheterias no mesmo ano e ganhou muitos elogios e até prêmios por seu incrível ano de estreia nos holofotes. E nem a indicação ao Framboesa de Ouro de Pior Nova Estrela poderia abalar seu início arrebatador.
Debi & Lóide ganhou o público com uma dupla tão adorável quanto idiota, tão afinada quanto atrapalhada e que se amavam tanto quanto eram capazes de brigar.
O filme atraiu muitos fãs com um humor escrachado, sem medo do exagero e apelando para o absurdo – mas em um universo realista, diferentemente das paródias do trio ZAZ (David Zucker, Jim Abrahams e Jerry Zucker) que influenciaram os irmãos Farrelly, como Apertem os Cintos… o Piloto Sumiu! (Airplane!, 1980), Top Secret! (1984) e Corra Que a Polícia Vem Aí (The Naked Gun: From the Files of Police Squad!, 1988).
A química dos protagonistas e o talento de Carrey para improvisar, fazer caretas e bastante comédia corporal, também ajudaram muito no sucesso da obra.
A VOLTA
Carrey sempre foi avesso a repetir um papel anterior. Havia o feito apenas uma vez, em Ace Ventura 2 – Um Maluco na África (Ace Ventura: When Nature Calls, 1995), ainda no início da carreira. Porém, um dia, ao rever Debi & Lóide sem querer, na TV, lembrou-se de como gostava dos personagens e das pessoas com quem havia feito o filme e sentiu vontade de voltar ao papel de Lloyd.
Daniels continuava com uma carreira sólida, mas sem chamar tanta atenção nos cinemas. Contudo, somente nos cinemas, porque as filmagens começaram um dia após ganhar um Emmy de Melhor Ator em Série de Drama, por The Newsroom.
Carrey também nunca deixou de ser o astro que anunciava em 1994. Até se empenhou em fazer papéis mais sérios, sendo sempre muito elogiado, mas já estava há alguns anos sem protagonizar um fenômeno de público ou crítica.
Já os irmãos Farrelly pareciam que nunca mais reencontrariam o grande sucesso de algum de seus quatro longas mais famosos. De qualquer jeito, eles se juntaram novamente e fizeram mais um bom filme de comédia.
Agora, em Débi & Lóide 2, os amigos se reencontram após tanto tempo sem sequer uma conversa de verdade. Harry descobre ter uma filha crescida e os dois decidem ir atrás dela, principalmente porque a garota poderia doar um rim para seu pai, que precisa de um transplante. Mas Lloyd se apaixona pela filha do melhor amigo.
Jim Carrey e Jeff Daniels estão tão bem em seus papéis quem nem parece que ficaram 20 anos longe deles, encarnando com talento uma dupla que continua espantando todos à sua volta com uma estupidez aparentemente sem limites.
Os dois ainda são experts na arte dos raciocínios mais absurdos do mundo e de constranger a todos com uma falta de modos infantil e um ingênuo ar de superioridade. E aparentemente as únicas pessoas que gostam da dupla são os espectadores, cúmplices em sua amizade sincera.
Usando várias referências e homenagens à produção original, que funcionam também como bons momentos cômicos, o filme pode não vir com o mesmo impacto do primeiro, mas, excetuando-se alguns problemas lógicos em seu final – ou talvez seja um pouco demais exigir qualquer lógica de um filme desses -, funciona muito bem e diverte bastante. Além da sensação de nostalgia, que costuma ajudar.
Com divertidas atuações também de Rob Riggle, Rachel Melvin, Kathleen Turner e uma participação especial quase imperceptível, Debi & Lóide 2 é uma comédia tradicional.
Sem as piadas puramente cinematográficas e o humor refinado de Edgar Wright, sem o nonsense do Monty Python. Não é uma comédia romântica, não é uma dramédia, não é uma comédia indie, não tem profundidade alguma. É apenas uma boa comédia com piadas das mais simples – o que não impede de serem boas e engraçadas – e muito apoiada no trabalho do elenco.
E essa sempre foi a proposta dos irmãos Farrelly. Nunca tentaram inovar a comédia, fazer algo diferente ou que suscitasse grandes emoções ou reflexões. Apenas querem fazer o público rir. E aqui, novamente, com uma bela ajuda de Daniels e Carrey, cumprem muito bem esse objetivo.
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