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Distopia: os 6 melhores livros do gênero

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Séculos atrás, o erudito, jurista, político e autor Sir Thomas More (sim, o mesmo que perdeu a cabeça à mando do rei Henrique VIII em The Tudors), uma das figuras mais interessantes e multifacetadas do Renascimento inglês, cunhou um termo original para designar uma sociedade ideal em termos tanto de leis quanto de governo e condições sociais: Utopia. A sua obra, publicada em 1516, inspirou diversos escritores posteriores, como Voltaire, Nathaniel Hawthorne, Jonathan Swift, Louisa May-Alcott e Edward Bellamy, que criaram as suas próprias sociedades utópicas.

Mas, ao longo dos anos, uma série de outros ficcionistas, como Ursula Le Guin em The Ones Who Walk Away from Omela (Aqueles que Deixam Omela), buscaram caminhos diferentes, negando a possibilidade da existência de uma sociedade ideal. Com o tempo, inclusive, outras mentes criativas deram um passo além e retrataram algo que podemos descrever, inclusive, como o contrário: sociedades nas quais não gostaríamos de modo algum de viver, por motivos os quais variam de narrativa para narrativa.

Esse gênero é o que, atualmente, conhecemos como Distopia. Em meio ao caos do mundo real, a Distopia nos oferece um espelho sombrio, refletindo nossos medos, esperanças e a complexa tapeçaria da natureza humana. São livros que nos advertem contra os perigos da complacência, da conformidade cega e do poder sem freios.

Hoje, estamos aqui para apresentar a você seis títulos indispensáveis que o conduzirão através de paisagens futuristas perturbadoras e provocadoras.

6# LARANJA MECÂNICA, ANTHONY BURGESS

Já assistiu aqueles filmes ou séries nos quais uma pessoa perfeitamente saudável é diagnosticada erroneamente com câncer e, por issom começa a aproveitar a vida de um jeito que não fazia antes? Bem, a criação de Laranja Mecânica não está muito distante disso: ela se deu em 1962, quando Anthony Burgess recebeu a notícia (falsa) de que estava a ponto de morrer e, preocupado com o sustento de sua esposa, decidiu escrever o mais rápido possível um livro com o potencial de se tornar um bestseller.

E conseguiu, não é mesmo? Escrito em questão de dias, Laranja Mecânica, com sua ultraviolência, conquistou muitos leitores e em menos de dez anos foi honrado com uma adaptação cinematográfica perturbadora dirigida pelo já célebre Stanley Kubrick.

Laranja Mecânica era originalmente dividido em três seções, cada uma delas de exatamente sete capítulos (segundo o próprio Burgess, se tratava de uma referência ao número 21, uma idade em que, na Inglaterra de sua época, se atingia a maturidade e portanto o direito ao voto e a necessidade de se assumir responsabilidades adultas). A edição americana, no entanto, cortou o último capítulo, e a adaptação de Kubrick fez exatamente o mesmo, de modo que o livro e o filme dão respostas distintas às questões apresentadas pelo autor.

Basicamente, o livro acompanha um adolescente delinquente – um assassino, estuprador e sádico – que, depois de preso por assassinato, é exposto a um programa de reabilitação que visa a que, através do condicionamento comportamental,  um detrator se torne incapaz de qualquer atitude violenta.

Diversas questões mais profundas são abordadas pelo livro, entre as quais as seguintes perguntas: o Estado teria o direito de punir seus criminosos ao tirar deles o seu livre-arbítrio e transformá-los em “laranjas mecânicas”? Qual, então, seria o equilíbrio ideal entre a segurança e a liberdade? Sob quais circunstâncias seria aceitável que o Estado acabasse com as liberdades individuais?

5# O CONTO DA AIA, MARGARET ATWOOD

Ambientado em uma versão distópica dos Estados Unidos, O Conto da Aia, de Margaret Atwood, mergulha em um futuro assustadoramente possível onde direitos básicos, especialmente aqueles das mulheres, são drasticamente restringidos. A história se desenrola na República de Gilead, uma teocracia totalitária que se formou após um golpe violento que derrubou o governo democrático anterior.

Nesta nova sociedade, a infertilidade é uma crise generalizada. Em resposta, as mulheres ainda capazes de conceber são são categorizadas e confinadas a funções específicas, todas subjugadas ao domínio masculino. Chamadas de “aias”, funções são macabramente simples: parir os filhos dos homens mais influentes dessa sociedade.

A protagonista, Offred, é uma aia. Ela jamais nos revela o seu verdadeiro nome. Tudo o que sabemos é o nome o qual é obrigada a adotar, um símbolo de sua subjugação completa ao senhor a quem serve, Fred. Of Fred, de Fred. O nome é deliberadamente perturbador.

Diz ela: “O meu nome não é Offred. Eu tenho outro nome, mas ninguém o usa atualmente porque foi proibido. Eu digo a mim mesma que isso não importa, que o nosso nome é como o nosso número de telefone, que é útil somente para os outros; mas o que eu digo a mim mesma não é algo verdadeiro. Importa, sim. Eu mantenho o conhecimento desse meu nome como algo oculto – um tesouro que voltarei para desenterrar, um dia”.

Através de Offred, Atwood nos oferece uma história arrepiante sobre poder, submissão e resistência – e, acima de qualquer outra coisa, uma história que nos lembra constantemente da fragilidade de nossos direitos e de nossas liberdades.

4# JOGOS VORAZES, SUZANNE COLLINS

Ambientada em um futuro pós-apocalíptico, a trilogia Jogos Vorazes, escrita por Suzanne Collins, introduz os leitores a Panem, uma nação formada por uma opulenta Capital e 12 distritos empobrecidos. A narrativa é uma crítica mordaz à desigualdade, à opressão e à exploração, contada através dos olhos da resiliente Katniss Everdeen.

A saga começa com os ecos do passado. Como punição por uma rebelião ocorrida décadas atrás, a Capital instituiu os Jogos Vorazes, um evento anual no qual um menino e uma menina, chamados tributos, são escolhidos de cada distrito para lutar até a morte em uma arena transmitida para todo o país. Quando a jovem irmã de Katniss, Prim, é selecionada, Katniss se voluntaria para tomar seu lugar. A partir daí, o destino de Katniss fica intrinsecamente ligado aos Jogos e à crescente insatisfação com o regime tirânico da Capital.

O segundo livro, Em Chamas, expande a luta de Katniss contra a Capital, enquanto ela se torna, involuntariamente, o rosto da resistência. Já a conclusão épica, A Esperança, nos conduz à inevitável guerra entre a Capital e os distritos. Katniss e seus aliados são forçados a fazer escolhas agonizantes, e o custo da revolução é explorado com profundidade emocional.

Inclusive, esse ano o spin-off Jogos Vorazes: A Cantiga dos Pássaros e das Serpentes será lançado, contando com a atuação de Peter Dinklage, Viola Davis e a estrela de Euphoria, Hunter Schafer.

3# NÓS, YEVGENY ZAMYATIN

Escrito no alvorecer da era soviética, Nós de Evgeny Zamyatin é uma obra-prima da Distopia que antecipa muitos dos temas e preocupações que viriam a dominar o gênero no século XX. O livro é um mergulho audacioso na natureza da liberdade, conformidade e o preço do progresso desenfreado.

A história se desenrola dentro das paredes de vidro da Cidade Única, uma sociedade futurista projetada para ser o ápice da eficiência e lógica. Os habitantes, privados de seus nomes, são conhecidos apenas por números e vivem sob a vigilância constante do Estado. Em vez de laços emocionais, a existência é regida por fórmulas matemáticas e decisões racionais.

D-503, nosso narrador e protagonista, é o engenheiro chefe do “Integral”, uma nave destinada a levar a “felicidade” e a lógica da Cidade Única ao cosmos. Contudo, o encontro de D-503 com a enigmática I-330 desencadeia uma crise pessoal e ideológica. Ele começa a experimentar emoções desconhecidas e questiona as fundações da sociedade em que vive. O que se segue é uma descida vertiginosa no mundo dos sonhos, da rebeldia e da descoberta do “eu” autêntico, contrastando fortemente com o mundo asséptico e previsível da Cidade Única.

Zamyatin, com sua narrativa aguda e estilo inovador, antecipa os questionamentos sobre a natureza da liberdade e a ameaça do autoritarismo tecnológico. Embora escrito quase um século atrás, ressoa com uma urgência contemporânea, servindo como um aviso sobre os perigos de sacrificar nossa individualidade e humanidade em nome do progresso ou da ordem. É um lembrete poderoso de que a verdadeira utopia reside na capacidade humana de sonhar, amar e, acima de tudo, ser livre.

2# 1984, GEORGE ORWELL

Um pesadelo totalitário se desenrola nas páginas deste eterno clássico da Distopia. Nele, George Orwell nos apresenta a um mundo no qual o Big Brother, ou Grande Irmão, está sempre observando cada cidadão, e a verdade é manipulada e reescrita pelo Estado. A privacidade é uma ilusão e a liberdade de pensamento é um crime.

Winston Smith, nosso protagonista introspectivo, trabalha no Ministério da Verdade, onde sua tarefa é reescrever a história para que ela sempre se alinhe às narrativas e objetivos do Partido. Neste mundo, os eventos passados são constantemente adaptados e manipulados para servir ao presente, e a verdade objetiva não tem lugar. “Quem controla o passado, controla o futuro”, é um dos lemas do Partido, e é com essa filosofia que dominam a população.

À medida que Winston começa a questionar a realidade que lhe é apresentada e se envolve secretamente com Julia, uma colega de trabalho, ele se embrenha em um perigoso jogo de resistência e descoberta. No entanto, aonde vive mesmo os pensamentos são traiçoeiros, e o simples ato de pensar é um crime — o chamado “crime de pensamento”, e Winston é preso, torturado e despido de sua humanidade.

Curiosamente, uma das coisas que distingue o romance de Orwell do de Zamyatin e de Huxley, que ocupam também o nosso pódio, é o seu sentido de urgência, porque ele tomou uma decisão diferente dos dois outros autores e fez com que a sua distopia acontecesse somente trinta e cinco anos no futuro, em vez de quinhentos ou mil anos.

E por que ele o faria? Basicamente porque 1948, o exato ano em que deu início ao livro, foi uma época aterrorizante. A Segunda Guerra Mundial já havia terminado, mas as pressões políticas eram intensas e a Guerra Fria estava somente começando. E, por isso, ao ler 1984 busque lembrar-se que esse clássico da Distopia é um toque de despertar para a vigilância constante contra as forças que buscam controlar, manipular e definir nossa realidade. Em uma era que, como a nossa, exige debates sobre privacidade, vigilância e desinformação, 1984 continua e continuará a ser uma leitura perturbadoramente relevante.

1# ADMIRÁVEL MUNDO NOVO, ALDOUS HUXLEY

Aldous Huxley nos transporta, em Admirável Mundo Novo, publicado no ano de 1932, a uma sociedade futurista meticulosamente criada para alcançar uma harmonia quase surreal. Mas, sob a superfície dessa ordem imaculada, encontra-se um preço alarmantemente alto.

Ou, como coloca a professora universitária Pamela Bedore, uma das maiores estudiosas do assunto: “Na sociedade obsedada pelo prazer e pela perfeição técnica de Huxley, a dor e o sofrimento são coisas do passado, mas à custa do quê? O preço que temos a pagar é a individualidade, a paixão e a autenticidade humanas”.

Neste novo mundo, a tradicional concepção de nascimento e família foi descartada. As crianças são geradas e cultivadas em “incubatórios”, sendo pré-determinadas em castas que vão desde os Alfas, a elite intelectual e física, até os Ípsilons, projetados para trabalhos mais mundanos.A estabilidade é a palavra de ordem, e para mantê-la, o Estado utiliza uma miríade de ferramentas: o consumo excessivo é incentivado, a história e a cultura tradicionais são suprimidas, e uma droga chamada “soma” é amplamente distribuída, garantindo que todos permaneçam em um estado de contentamento induzido.

Em sua visão lúcida e perturbadora, Huxley questiona em sua distopia o verdadeiro significado de “progresso”. E, como ele próprio afirma: “Talvez as forças que agora ameaçam a liberdade sejam fortes demais para que tenhamos a capacidade de resistir a elas por muito tempo. Ainda assim, continua sendo nosso dever resistir”.

Camila Nogueira Nardelli

Leitora ávida, aficcionada por chai latte e por gatos, a socióloga Camila escreve sobre desenvolvimento pessoal aqui no El Hombre.

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