Ela diz que te ama, mas na verdade ama a si mesma

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Declarações de amor são tão fáceis de fazer… Você não precisa ser um artista para isso. A paixão é capaz de transformar qualquer dizer chinfrim em composição de rara qualidade. Um simples “eu te amo” ganha traços shakespearianos a ouvidos apaixonados.

O problema é que nem sempre as palavras caminham ao lado das emoções.

Sinto que temos uma facilidade enorme em confundir o sentimento de amor. Tudo bem que definir amor é tarefa impossível — mas traçar alguns limites, usando o bom senso, é tarefa válida.

O amor não é o desejo profundo de ter a pessoa do lado. Isso é paixão. E a paixão é como uma droga — ela inebria e gera abstinência.

Apesar de ser disparada por um sentimento em relação a alguém, a paixão, na verdade, é egoísta: a companhia, a atenção, o beijo, o sexo da pessoa traz-nos uma experiência interna empolgante, jubilosa! E a paixão só é atendida quando o outro realiza as expectativas que ela necessita.

Quando isso não acontece, o jogo vira e dá vazão a sentimentos de revolta, como ciúmes, inveja, raiva, rancor… vixi, a lista é extensa! (E você sabe disso, vai.)

Então podemos concluir que a pessoa pela qual estamos apaixonados é, em essência, uma ferramenta para experimentarmos sentimentos extasiantes. Puro egoísmo.

Mas isso não é um problema necessariamente — se torna um problema quando não há amor.

O amor é sentimento nobre, que exige renúncia. Aqui, pensa-se no outro e não apenas em si.

O desejo intenso de ter a pessoa ao lado acalma-se por compreender que naquela noite ela não pode; a vontade louca de fazer sexo tranquiliza-se ao perceber que ela não está afim naquela hora.

No amor há espaço para frustrações. Na paixão não.

Ela diz que te ama, mas não compreende sua necessidade de ficar sozinho; mas exige que você corte o cabelo porque já está muito grande; mas quer ficar a noite inteira no telefone mesmo que você tenha que acordar 5:30 na manhã seguinte? Ops…

A real é que ela ama a si mesma. Ela quer satisfazer suas vontades próprias e não está muito interessada na sua pessoa para além do prazer que você pode lhe proporcionar.

Parece duro demais jogar as palavras assim, irresponsavelmente, sem aviso prévio de conteúdo temerário, desnudando a realidade. Mas é o que é. Não é?

Vamos convidar Clarice Lispector a expressar-se sobre o assunto:

“Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil. É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a solenidade ritualiza a incompreensão e a transforma em oferenda. E é também porque sempre fui de brigar muito, meu modo é brigando. É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria – e não o que é. É porque ainda sou eu mesma, e então o castigo é amar um mundo que não é ele. É também porque me ofendo à toa. É porque talvez eu precise que me digam com brutalidade, pois sou muito teimosa.”

O trecho foi retirado do livro Felicidade Clandestina e penso que coroa a reflexão como eu jamais poderia fazer. E se você quiser levar apenas uma frase desse texto, que seja essa:

“É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria – e não o que é.”

Sem mais, portanto.

Thiago Sievers

Co-fundador do El Hombre, é responsável pelo canal do YouTube e pelas parcerias comerciais. Vem trabalhar todo dia de bicicleta e tem um condicionamento de atleta olímpico. É editor também do "Moda Masculina Journal".

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