Há alguns dias estava conversando com uns amigos e o papo me deu vontade de bater com a cabeça na parede. Isso porque eles entraram num assunto que vira e mexe entretém a roda: um outro parceiro barangueiro.
Se você não está familiarizado com o termo, vamos à explicação: baranga é gíria para mulher feia. Logo, barangueiro é o cara que costuma se envolver com mulheres feias, ainda que feiura seja um conceito bastante relativo.
Eu tenho vergonha só de me ocupar da explicação. Mas prossigamos.
As piadas rolaram solta e eu pensei um pouco aturdido: “Meu Deus, isso é bem comum”. Sim, na verdade é mais normal existir papo desse tipo num grupo de amigos do que não existir.
Confesso que entrei em ligeiro choque ao perceber que eles se divertiam com o assunto. E o que me chocou foi um fato simples: o motivo da piada era uma outra pessoa — que não era o amigo ausente, mas as mulheres que eles julgavam feias.
É como se elas fossem indignas de qualquer afeto honesto, tendo que se contentar com o carinho de “homens sem noção como os barangueiros”.
É como se “mulheres feias” fosse uma categoria inapropriada a homens respeitáveis — esses mesmos que fazem as brincadeiras.
É como se o valor mais relevante para julgar alguém fosse a estética. Sem mencionar o fato de reduzir beleza à simples determinação do traçado biológico.
Insensato assim, nesse nível superficial.
Quando traduzimos em palavras, a tolice do cenário fica muito destacada. Mas no dia a dia essas coisas acontecem a rodo. Passam pelos nossos ouvidos sem serem notadas. São comentários comuns, brincadeiras padrão que compõem nosso cotidiano.
Nada demais, né?
E não quero ser hipócrita: brincadeiras assim já saíram da minha boca. Há algum tempo por diversão, por achar graça também. Mais recentemente, por necessidade de adaptação.
Pois sim, numa roda de amigos onde todos estão nessa mesma sintonia, se você soltar um comentário do tipo, “Pô, galera, vocês estão viajando”, o motivo da chacota passa a ser você, que não tem espírito esportivo.
Ao ler minhas palavras, talvez alguns mencionem o enfadonho papo do politicamente correto. Só que a questão aqui não é de politicagem, mas de humanidade mesmo.
Uma pessoa não deve ser motivo de piada. A realidade do bullying já nos mostrou as consequências trágicas que essas posturas podem acarretar. Essa é a dinâmica de uma sociedade onde o poder de um cresce em detrimento da moral do outro.
Como construir um mundo fraterno dessa forma?
Diante disso, frases como a de Gandhi — “Seja a mudança que você quer ver no mundo” — nunca foram tão apropriadas.
Enquanto resistir o conceito de homem barangueiro, estamos perdidos.
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