Um sociopata vingativo que quer o poder a qualquer preço, casado com uma executiva bonita, gélida, sofisticada e mais falsa que uma nota de 3 dólares. Você já viu isso no cinema, já leu em bons livros, mas não tinha assistido nada parecido na TV até House of Cards, a série produzido pelo canal de internet Netflix.
Segundo o site IMDB (Internet Movie Data Base), que mede a aceitação no cinema e na televisão, é a séria mais popular do mundo agora. A Netflix mirou no futuro e fez um gol. Os 13 episódios foram postos no ar simultaneamente, rompendo com o modelo que o CEO da empresa chamou de “administração da ansiedade” das TVs a cabo ou abertas. Você assiste na hora que quiser – e, se quiser, tudo de uma vez. (A Netflix já avisou que está fazendo novos episódios da sensacional Arrested Development, cancelada em 2007, depois de detectar, através de ferramentas do próprio site, que ela continuava uma das preferidas do público.)
House of Cards é um retrato cruel e fiel da política e, mais amplamente, das relações humanas. Adaptada de um seriado da BBC e inspirada em duas tragédias de Shakespeare (Ricardo III e McBeth), tem Kevin Spacey no papel de Frank Underwood, um mercenário do Partido Democrata. Claire (Robin Wright) é sua senhora. Frank foi fundamental na eleição do presidente. Esperava ser recompensado com o cargo de secretário de defesa. Ao ser preterido, jura vingança eterna – e passa o tempo manipulando, mentindo e montando dossiês para detonar o governo.
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Basicamente, ninguém vale nada. Congressistas, assistentes, lobistas, jornalistas, secretários… todos estão interessados apenas em si mesmos, em suas carreiras, em suas vidas, em como se dar bem. No início, você tem alguma esperança na humanidade da mulher de Frank, até que ela revela sua verdadeira natureza, a mesma de Lady McBeth, dissimulada e insaciável (a única pessoa que tem fé em Claire é o escritor, roteirista e ator de comédias ligeiras Marcelo Zorzanelli).
Frank se envolve com uma jovem jornalista chamada Zoe Barnes (Kate Mara), a quem alimenta com denúncias. Ela publica em seu blog. Estoura. Seu chefe velha guarda, que odeia a internet e vive em negação de que o jornal que dirige está indo para o buraco, a demite. Ela vai para um site inspirado no Huffington Post. O único personagem que inspira alguma compaixão é um deputado com um passado de drogas, bebidas e prostituição. Ele trai sua base, que são os trabalhadores de um píer, e tenta se redimir. Naufraga esplendidamente.
House of Cards virou mania em Washington. Houve gente falando que é injusto e fantasioso. Outros se queixaram de que os interiores do Capitólio não são decorados daquela maneira (uma espécie de buffet de casamento com móveis Luís XV). Jornalistas se queixaram da maneira como a repórter é retratada, disposta a fazer sexo em troca de furos (vamos fazer de conta que isso não existe).
Todo o elenco é incrível, mas Spacey está arrasador. Os momentos em que ele encara a câmera e faz comentários são engraçados, trágicos e sugerem uma intimidade com o espectador que, eventualmente, você preferiria não ter. “Não há descanso ou paz no céu ou no inferno. Apenas nós mesmos. Pequenos. Solitários. Esforçados. Lutando uns contra os outros. Eu rezo para mim mesmo – por mim mesmo”, diz Frank para a câmera, olhando diretamente para você. Assinale o candidato que você acha que se encaixa melhor nessa descrição.