O texto a seguir, que contempla o musical Hamilton e as lições de liderança contidas neste, foi escrito por múltiplos especialistas no assunto e, caso você seja fluente em inglês e deseje ler o original, encontra-se publicado aqui.
O storytelling através da música vem sendo há muito tempo uma excelente fonte de compartilhamento de perspectivas e ensinamentos. Em uma obra ficcional, além das tramas básicas o poder das letras pode também inspirar reflexão, em especial quando associado a temas de ética, moral ou transmissão de sabedoria.
Os musicais da Broadway são especialmente habilidosos em se conectar com grandes públicos, e o aclamado musical Hamilton não foi exceção. Como um musical que se concentra em liderança e trajetória de carreira, Hamilton destaca uma série de lições-chave que são aplicáveis no meio acadêmico e profissional.
Neste texto, exploramos vários desses temas principais, incluindo maximizar oportunidades, escutar, autorreflexão, compromisso, paciência, empatia, priorização, cuidar de relacionamentos, abordar decisões difíceis, saber quando dizer adeus e gerenciar um legado.
Em uma carreira, as oportunidades podem se apresentar de maneiras inesperadas e em momentos imprevistos, e é crucial desenvolvermos um pensamento crítico sobre se devemos ou não seguir uma oportunidade em particular.
No início de sua carreira, Alexander Hamilton é um jovem ambicioso determinado a fazer a diferença em sua nova pátria. Sua reputação, habilidade de escrita e ética de trabalho são notadas por George Washington, que o convida para ser seu ajudante de ordens. Apesar do prestígio que essa oportunidade envolve, Hamilton hesita em aceitá-la porque a carreira que ele havia imaginado envolvia o serviço militar em si, e não um papel secretarial. No entanto, Hamilton reconheceu os potenciais benefícios e aceitou a posição, mesmo que não fosse sua primeira escolha. Trabalhar com Washington acabou levando a muitas oportunidades para Hamilton e lhe permitiu influenciar o desenvolvimento da nação americana que estava por despontar.
Da mesma forma, é raro na academia que a carreira de um membro do corpo docente siga um caminho previsto, pois oportunidades inesperadas podem surgir, enquanto avanços planejados podem nunca ocorrer. Navegar por este caminho no início de uma carreira acadêmica pode ser difícil; portanto, ter mentores fortes é fundamental.
A decisão de seguir uma nova oportunidade ou assumir um papel de liderança não deve ser tomada levianamente. Há líderes bem-sucedidos que não estavam buscando um papel em específico quando este surgiu. Encontrar o equilíbrio adequado e identificar mentores para fornecer orientação sábia são coisas extremamente importantes para o avanço da carreira.
A vida acadêmica incentiva a exploração individual de pesquisas e práticas clínicas, ao mesmo tempo em que exige colaboração em grupo e consenso sobre objetivos, visão e valores. Não é incomum que membros do corpo docente com diferentes papéis dentro da instituição tenham dificuldade em compreender os pontos de vista de outros ao considerar currículo, orçamento ou outras questões. Assim, a escuta ativa é uma habilidade crítica necessária para a colaboração e comprometimento em todos os ambientes.
Alexander Hamilton não era o melhor dos ouvintes no início de sua carreira. Ele era rápido em expressar sua opinião, muitas vezes antes de ouvir o outro lado de uma discussão. Essa tendência foi notada por colegas, como exemplificado pelo personagem Aaron Burr, que aconselha Hamilton a “falar menos, sorrir mais”. Da mesma forma, membros de uma equipe que não possuem habilidades de escuta ao discutir tópicos com colegas podem ser percebidos como inacessíveis ou sem coleguismo. Se aqueles em cargos de liderança expressarem suas visões abertamente, as opiniões contrastantes e a discussão podem ser inibidas.
Em contraste com a precipitação de Alexander Hamilton, o Presidente George Washington demonstrou a eficácia das habilidades de escuta ativa durante as “batalhas do gabinete” no musical. Indivíduos de cada lado de um tópico importante tinham tempo para apresentar seu caso enquanto o presidente ouvia sem interromper. Ele tomou uma decisão apenas após ouvir ambos os lados de uma questão. Esse formato fomentou discussão e debate, valorizou opiniões divergentes e, em última análise, contribuiu para o sucesso do país. É importante que, em nossas carreiras, busquemos um equilíbrio entre decisões rápidas, que às vezes são necessárias para responder a uma necessidade urgente, e decisões onde ouvir e aprender com os outros seria de maior valor, mesmo que estas levem mais tempo.
O autoconhecimento e a humildade são componentes essenciais em uma carreira bem-sucedida. Como jovem oficial com acesso direto a George Washington, Hamilton via-se como uma estrela ascendente e era arrogante em suas interações com os outros, como retratado no número musical “Non-stop”. A arrogância de Hamilton e a falta de autoconhecimento inicialmente prejudicaram seu sucesso como Secretário do Tesouro, pois outros se sentiam desagradados por sua atitude. Com o tempo, no entanto, Hamilton reconheceu essas deficiências e trabalhou para superá-las. Um dos pontos de virada na carreira de Hamilton foi quando ele estava trabalhando para criar um sistema bancário nacional, mas não tinha os votos necessários para que seu projeto fosse ratificado pelo Congresso. Quando confrontado com essa difícil realidade, Hamilton refletiu sobre suas ações e se aproximou humildemente de Thomas Jefferson para resolver o conflito entre eles.
O compromisso histórico entre Hamilton e Jefferson, retratado no musical, resultou na criação de um banco nacional e estabeleceu a localização da capital nacional. Da mesma forma, todos nós enfrentaremos situações que exigem compromissos e negociações, seja sobre currículo, recursos, orçamentos ou tempo. O compromisso requer escuta atenta, autorreflexão e, possivelmente, concessão no intuito de alcançar um terreno comum. No musical, apesar de discordarem e desgostarem pessoalmente um do outro, esses dois Pais Fundadores comprometeram-se e negociaram questões de alta importância para levar o país adiante. Da mesma forma, podemos ter que fazer o mesmo para crescer e avançarmos em nossas carreiras.
Hamilton é um personagem falho em muitos aspectos, especialmente por sua impulsividade e incapacidade de considerar as repercussões de suas ações. Trabalhar sem parar trouxe vantagens profissionais para Hamilton, mas também criou dificuldades em sua vida pessoal. Em contraste, Aaron Burr se descreve como alguém disposto a esperar pelo momento e oportunidade perfeitos. Embora o musical retrate isso como uma característica negativa, Burr demonstra paciência na liderança. Na música, “Wait for It”, Burr canta: “Eu sou a única coisa na vida que posso controlar” e “Estou disposto a esperar por isso”, que são observações úteis para aqueles que estão considerando um cargo administrativo ou de liderança. Os objetivos devem ser cuidadosamente refletidos em relação ao planejamento e ao tempo de carreira. Estar disposto a “esperar por isso” ajudará a garantir o sucesso profissional e pessoal, buscando as melhores oportunidades.
Hamilton tinha muita dificuldade em dizer não quando lhe pediam para assumir novas responsabilidades. Como resultado, ele trabalhava incessantemente, a ponto de isso levar a muitos conflitos em sua vida pessoal. Sua esposa, Eliza, suplica a Hamilton que faça uma pausa e juntar-se à sua família no norte durante o verão, mas ele constantemente foca na sua necessidade de trabalhar em seu plano para o Congresso. Assim como Hamilton, é tentador nos sobrecarregarmos. Isso pode ser especialmente difícil quando somos mais jovens e precisamos ainda de orientação para aprendermos a priorizar estrategicamente nossos esforços em direção a alcançar um objetivo de carreira bem planejado. É importante identificarmos as oportunidades de serviço que melhor se alinham com os nossos objetivos pessoais e profissionais. Estar disposto a dizer não no momento certo é essencial no intuito de garantir sucesso profissional e pessoal.
Uma das canções mais emocionantes do musical é “It’s Quiet Uptown”, com uma linha que diz “Eles estão passando pelo inimaginável”, cantada após os Hamilton sofrerem a perda súbita de seu filho mais velho. Enquanto o objetivo da canção é lembrar aos outros para serem solidários à família Hamilton, é um bom lembrete da importância da empatia. E é fato que demonstrar empatia é uma habilidade essencial para um líder.
Um líder empático é mais acessível àqueles que estão enfrentando dificuldades. Por exemplo, quando um líder está avaliando os motivos para um declínio no desempenho de um membro de sua equipe, a falta de empatia pode causar uma deterioração ainda maior no esforço e no moral desse membro. Por outro lado, abordar a situação com empatia e apoio pode encorajar o integrante da equipe, levando a uma maior produtividade e lealdade à organização. Uma série de problemas pessoais, desde problemas conjugais até uma doença grave, pode afetar o desempenho profissional de alguém. Iniciar conversas difíceis com uma pergunta como: “Estou preocupado com você. Está acontecendo alguma coisa na sua vida?”, pode servir como início para uma discussão solidária. Os líderes devem ser empáticos com os desafios e adversidades enfrentados pelos seus subordinados para administrar uma organização saudável.
O mundo é pequeno, especialmente dentro do universo corporativo. Ter alguém que diga “Eu conheço essa pessoa” a seu respeito pode ser um poderoso incentivo (ou “desincentivo”) quando você está sendo considerado para um emprego, especialmente se tratar-se de um cargo de liderança. É importante que cuidemos de todas as nossas relações e criemos uma boa rede de contato ao longo da trajetória de nossas carreiras, pois essas conexões podem influenciar a próxima nossa posição ou facilitar a transição a um cargo de liderança.
Decisões difíceis e impopulares são comumente uma parte do trabalho de todo líder. Na versão musical da eleição de 1800, Hamilton foi confrontado com a decisão de qual apoiar entre dois de seus principais rivais, ambos candidatos à Presidência dos Estados Unidos. Hamilton aborda essa decisão mantendo-se fiel ao seu código moral e ético. Embora ele “nunca tenha concordado com Thomas Jefferson uma única vez”, admirava as fortes crenças e valores de Jefferson. Em contrapartida, desafiou Aaron Burr repetidamente ao longo do musical, perguntando em certo momento: “Se você não defende nada, pelo que morrerá?” Nenhum dos candidatos parecia uma boa escolha para Hamilton, mas ele usou seus valores e princípios orientadores para fazer a escolha “menos ruim” entre seus dois rivais.
À medida que os números de admissões e orçamentos diminuem, os líderes são confrontados com decisões difíceis que não têm respostas corretas. Nessas situações, é imperativo refletir sobre o processo de tomada de decisão e tentar prever as repercussões de cada escolha difícil. Muitos dos pontos de discussão anteriores, como encontrar mentores fortes e ouvir todas as opiniões, são conselhos sólidos ao enfrentar esses desafios, mas é vital que um líder se mantenha fiel aos seus próprios princípios e ética, considerando alternativas que não comprometam seus valores.
Uma das lições mais comoventes da história dos Estados Unidos é o conceito de uma transição pacífica de poder e planejamento de sucessão. Após ser eleito para dois mandatos presidenciais, George Washington decidiu renunciar à disputa por um terceiro mandato unicamente porque acreditava que era do melhor interesse do país ter outra pessoa liderando a próxima fase.
Assim como Washington, todo líder tem que se valer de sua capacidade de introspecção e autoconhecimento para saber o momento de se afastar (seja porque alcançou seus objetivos, ou porque está sendo recrutado para uma nova oportunidade). Inclusive, o mentoreamento e o planejamento de sucessão são responsabilidades importantes que um líder deve assumir. As administrações devem estar continuamente investindo recursos na formação de possíveis sucessores a fim de manter a instituição bem preparada para mudanças de liderança inesperadas.
É vital identificar o que é verdadeiramente importante na vida de alguém. A canção final, “Who Lives, Who Dies, Who Tells Your Story”, é um resumo das maiores realizações de Hamilton, contadas sob a perspectiva de várias pessoas. Jefferson e Madison se maravilham com a visão de futuro de Hamilton e a criação de um sistema financeiro à prova de balas. Após a morte de Hamilton, eles concordam que ele não recebeu o crédito merecido por suas conquistas. A canção continua, mas a direção muda dos adversários e colegas de Hamilton para a perspectiva de sua esposa, Eliza, e ela é quem conta a história de luta, determinação e perseverança de seu marido.
Ninguém é perfeito, incluindo Hamilton, que ocasionalmente tomava decisões que traíam seus valores fundamentais. No entanto, sua capacidade de aprender com seus erros e capacidade de pedir perdão acabaram por redimi-lo. Líderes cometerão erros, e muitas vezes é a habilidade de corrigir e aprender com os erros que determina o sucesso e como serão lembrados profissionalmente. Contudo, no final das contas, são as relações pessoais cultivadas ao longo de uma vida que sustentam e garantem nossos legados duradouros.
Winston Churchill famosamente opinou que “aqueles que não aprendem com a história estão condenados a repeti-la”. Observando as experiências dos Pais Fundadores, pode-se dizer o mesmo sobre liderança. A vida de Alexander Hamilton demonstrou isso muito bem, seja historicamente ou escrita com licença poética. Muitas das situações enfrentadas e soluções encontradas pelos Pais Fundadores ainda são aplicáveis atualmente. Uma última mensagem do musical Hamilton que parece especialmente apropriada é “olhe ao redor e veja quão sortudos somos por estarmos vivos agora”.
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