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O maratonista que pifou a metros da vitória

O texto “O maratonista que pifou a metros da vitória” foi publicado originalmente em julho/2012; veja aqui mais artigos da série “Clássicos ELH”, uma coletânea de textos atemporais em comemoração ao aniversário de 10 anos do El Hombre.

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“Foi um espetáculo como jamais se viu antes, e os que viram não acreditam que possam ver algo parecido se repetir.” Assim escreveu o jornal NY Times em sua edição de 25 de julho de 1908.

Mais de um século depois, é difícil discordar. O Times se referia ao final dramático, sensacional, comovedor da maratona das Olimpíadas de Londres de 1908. O protagonista da história foi um jovem corredor italiano, Dorando Pietri, 22 anos, um padeiro baixinho, bigodudo, com “ares chaplinianos”, nas palavras do autor de um livro sobre os jogos de 1908.

Calcula-se que um milhão de pessoas acompanharam a corrida nas ruas de Londres. Era um dia lindo de verão. No estádio lotado, a multidão aguardava ansiosa a chegada do vencedor. Não havia TV, não havia rádio – e isso aumentava enormemente a expectativa em torno da corrida.

Os competidores partiram do Palácio de Windsor para cumprir um percurso de 42,195 quilômetros que conduziria ao estádio White City, construído especialmente para as Olimpíadas e demolido na década de 1980. Restaria ao vitorioso, ao entrar no White City, uma volta na pista do estádio para a consagração diante do Camarote Real, sob as vistas da Rainha Alexandra.

Pietri enfim apareceu. Ele fez uma grande corrida e estava alguns minutos na frente do segundo colocado, o americano Johnny Hayes.

A plateia delirou com Pietri.

Mas, para estupefação geral, ele simplesmente pifou. Exausto no limite, ele não sabia que direção deveria tomar ao romper no estádio. Direita? Esquerda? Algumas pessoas tentaram ajudar, mas Pietri desconfiou delas. Ele enfim foi para o lado certo, mas em frangalhos. Caiu algumas vezes, e recebeu em todas elas auxílio para se reeguer. Pietri cruzou afinal a linha de chegada ainda à frente de Hayes. Mas a delegação americana se queixou e a medalha de ouro acabou sendo dada a Hayes.

Os espectadores estavam todos com Pietri. A rainha fez questão de dar depois a ele uma medalha em honra de seu esforço épico. Ninguém festejou Hayes.

Não foi a única cena marcante da maratona de 1908. O favorito para a vitória era um índio canadense chamado Tom Longboat. Longboat era chamado de Maravilha Índia, e obtivera vitórias expressivas em maratonas. Ele estava indo bem até subitamente cair depois de alguns quilômetros.

Ficou a suspeita de que a Maravilha Índia tivesse tomado além da conta estricnina, na época consumida em pequena dose como um estimulante para atletas. Mas alguns levantaram também a hipótese de Longboat ter sido derrotado pela bebida: ele gostava de tomar cerveja.

De Pietri, sobrou uma especulação jamais esclarecida. De acordo com ela, o percurso da corrida foi ligeiramente ampliado na última hora para que os netos da rainha pudessem ver, de um lugar privilegiado, os maratonistas partirem do Palácio de Windsor.

Lenda? Verdade?

O que é certo é que o pequeno italiano entrou para a história exatamente por deixar escapar a medalha de ouro de uma maneira tão singular. Se tivesse vencido, seria apenas um nome a mais numa lista com nomes dos quais ninguém se lembra.

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Paulo Nogueira
Paulo Nogueira
Paulo Nogueira (1956-2017) é o pai de Pedro Nogueira, editor-chefe do El Hombre. "Ele foi meu herói", diz Pedro. "E continua sendo." Ao longo da carreira, dirigiu várias revistas da Abril e da Globo. Também escreveu artigos para o El Hombre que, frequentemente, reeditamos e republicamos no site.