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O que aprender com Caravaggio

O texto “O que aprender com Caravaggio” foi publicado originalmente em outubro/2012; veja aqui mais artigos da série “Clássicos ELH”, uma coletânea de textos atemporais em comemoração ao aniversário de 10 anos do El Hombre.

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Foi um gênio. Inventou o “tenebrismo”, palavra que vem de tenebroso. E significa o jogo de claro e escuro numa pintura exatamente para acentuar o aspecto sombrio. Inovou ao simplesmente reproduzir a realidade feia que via sem se preocupar em melhorá-la e embelezá-la artificialmente. Foi, por isso, um precursor do realismo e do naturalismo. “A arte moderna começa com Caravaggio”, um especialista escreveu.

E foi um delinquente, um encrenqueiro. Um assassino.

Caravaggio matou um homem num duelo em Roma. Por trás do duelo, travado numa quadra de tênis, estavam dívidas. Antes já mostrara o caráter arruaceiro. Esfregara comida na cara de um garçom. Prometera “fritar as bolas” de desafetos. Fazia palhaçadas nas tavernas, como mostrar às pessoas como ensinara seu cachorro a andar apenas com as patas traseiras.

Mas como pintava.

Numa época em que Roma estava cheia de igrejas para serem decoradas, o talento extraordinário o fez o pintor mais célebre da cidade.

Seus protetores poderosos não conseguiram livrá-lo das consequências do assassinato. Caravaggio fugiu para Nápoles primeiro, e depois para Malta. Mas voltou a se meter em encrencas, e acabou numa cela subterrânea da qual conseguiu fugir ninguém sabe como.

Fez em Malta um de seus quadros mais perturbadores. Davi segura a cabeça de Golias. Golias é o próprio Caravaggio. Esperava com este quadro obter perdão em Roma, para onde desejava voltar. Você pode ler neste quadro a seguinte inscrição, em latim:  “Humilitas occedit superbiam”. A humildade supera o orgulho.

Repare no vencedor, Davi. Em sua expressão. Ele não está feliz, mas desolado. Parece à beira de chorar.

Caravaggio se encaminhou para Roma, mas não chegou. Morreu no caminho, em 1610, aos 38 anos, vítima de si mesmo mais que de qualquer doença.

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Paulo Nogueira
Paulo Nogueira
Paulo Nogueira (1956-2017) é o pai de Pedro Nogueira, editor-chefe do El Hombre. "Ele foi meu herói", diz Pedro. "E continua sendo." Ao longo da carreira, dirigiu várias revistas da Abril e da Globo. Também escreveu artigos para o El Hombre que, frequentemente, reeditamos e republicamos no site.