E quando é o silêncio que predomina na vida de um casal? E quando já não há mais troca de olhares, de palavras, de carinhos? Qual será o significado?
Ontem observava um casal almoçando. Um sentado em frente ao outro – composição propícia ao encontro dos olhares. Mas ele virava-se para a direita e ela para a esquerda. Quebravam a conexão, permanecendo em direções opostas. Não partilhavam de um momento, de uma intimidade. Havia apenas o silêncio.
Pedro Antônio Gabriel, publicitário criador de “Eu me Chamo Antônio”, escreveu em um de seus guardanapos: “O silêncio só é mudo da boca para fora”.
E isso é, por vezes, bastante correto.
Temos a impressão de que quando nos calamos é porque não há nada a ser dito. Morre enganado o leitor que acreditar apenas nesta máxima.
Nos silenciamos também para aquilo que é o mais difícil de ser falado. Quando nos falta coragem, quando é pesado demais, quando as palavras não são o suficiente, ficamos quietos.
Nos silenciamos para aquela emoção que nos transborda e que é tão repleta de significados que se torna de difícil tradução.
O silêncio é o vazio de som, mas pode ser completo de “barulho” interno. Nota-se, então, a importância de escutarmos essa ausência, este hiato, tão presente na vida de muitos casais.
A psicanálise surge como uma talking cure (ou cura pela palavra), a ideia de que através da fala conseguiríamos transbordar aquilo que nos sufoca, que faz sofrer, que nos angustia. E, a partir daí, elaboramos, junto com o terapeuta, aquilo que nos ouvimos dizer.
Porém, o silêncio não é menos importante nesta relação. Períodos em que não há o que ser dito, ou que estamos cansados demais para isso, são importantes para uma boa análise tanto quanto o falar desenfreado. Deve-se dar voz ao silêncio.
E voltando para aquele casal, pensando em tantos outros que possam estar lendo este texto, muitas vezes o silêncio de palavras, olhares e carinho pode representar uma pausa, um vão que convoca o outro.
O calar-se não representa somente a falta de interesse de um pelo outro – mas pode significar justamente o contrário: o desejo de que o outro o resgate, o conquiste. Assim se torna um silêncio não vazio, mas pleno de vontade e desejo.
O silêncio, portanto, vai muito além da ausência ou da inibição. Ele pode ocorrer não como um obstáculo em uma relação a dois, mas como indicativo de que ali há muito a ser dito, pensado e elaborado.
E se este casal corajoso topar ouvir este silêncio que amedronta, ganhará a capacidade de superação das adversidades e de assunção de uma nova configuração psíquica para o par.