Muito antes de o filósofo Daniel Dennett estabelecer suas quatro regras para criticar com gentileza, o notável escritor franco-libanês Amin Maalouf discutiu a chave para o dissentimento inteligente e para a crítica eficaz em um trecho de seu livro In the Name of Identity: Violence and the Need to Belong. Trata-se de uma exploração magnífica dos conflitos e de como habitamos nossos seres.
A reciprocidade na crítica
Maalouf, nascido no Líbano de pais cristãos e educado com o árabe como língua materna, emigrou para a França aos 20 anos. Dentro desse contexto, ele reflete sobre como sua identidade composta e incomum o ensinou sobre o direito de criticar o Outro:
A palavra-chave é reciprocidade. Se busco pertencer ao meu país de adoção, se agora o considero meu novo lar e me vejo como parte dele, tenho o direito de criticar todos os seus aspectos. Da mesma forma, se ele me respeita, reconhece o que trago para ele e me vê e às minhas características como parte de si, tem o mesmo privilégio. Tem o direito de rejeitar aspectos de minha cultura que possam ser incompatíveis com seu modo de vida ou com o espírito de suas próprias instituições.
Para além da relação “indivíduo x cultura”
Esse direito recíproco à crítica transcende a relação entre um indivíduo e uma cultura. Ele se aplica a quase todos os aspectos da vida onde mentalidades e sistemas de valores diferentes entram em contato. Maalouf acrescenta:
O direito de criticar alguém deve ser conquistado, merecido. Se, de maneira geral, você trata o outro com hostilidade ou desprezo, seu menor comentário adverso, seja justificado ou não, será visto como um sinal de agressão, muito mais propenso a torná-lo obstinado e inacessível do que a persuadi-lo a mudar para melhor.
Por outro lado, se você demonstra por alguém amizade, simpatia e consideração de modo sincero, é diferente. Então você pode se permitir criticar, com alguma esperança de ser ouvido, coisas que nele considera passíveis de objeção.
[…]
Para se aproximar de alguém de forma convincente, você deve fazê-lo de braços abertos e cabeça erguida, e seus braços não podem estar abertos se sua cabeça não estiver erguida.
Artigo escrito por Maria Popova no site The Marginalian, traduzido ao português pelo El Hombre.