O texto “Quando surgiu o lema o importante é competir” foi publicado originalmente em julho/2012; veja aqui mais artigos da série “Clássicos ELH”, uma coletânea de textos atemporais em comemoração ao aniversário de 10 anos do El Hombre.
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O lema olímpico “o importante é competir” surgiu nos Jogos de Londres, em 1908. Como todos podem imaginar, ele foi imediatamente destruído pela áspera realidade.
Foi assim.
Numa missa na Catedral de São Paulo, pouco antes do início das competições, um bispo afirmou o seguinte: “Ganhar não é tão importante quanto participar”. O Barão de Coubertin, o criador das Olimpíadas modernas, gostou tanto da frase que a adotou, com ligeiras adaptações.
Mas.
Mas já então o que todo mundo queria era, simplesmente, ganhar. Em 1908, havia uma disputa particular entre um império que recuava – a Grã Bretanha – e outro que emergia, os Estados Unidos. (Hoje, passado mais de um século, a mesma situação se repete na mesma Londres, com os Estados Unidos minguando e a China florescendo.)
O chefe da delegação americana fez uma queixa: “Eles só estão interessados em derrotar os americanos, com uma conduta antidesportiva e injusta”.
A ira americana se acirrou particularmente na corrida de 400 metros, da qual participaram três atletas dos Estados Unidos e um britânico. O americano estava prestes a vencer quando um fiscal inglês simplesmente desfez a fita de chegada. A alegação era que ele obstruíra um atleta britânico.
Um caos de trinta minutos tomou conta da pista de atletismo. Corredores e fiscais gritavam uns com os outros. Finalmente, foi decidido que haveria, dois dias depois, uma nova prova. Os americanos boicotaram, e o inglês correu sozinho rumo ao ouro.
Foi em decorrência deste episódio que foi formada a Federação Internacional de Atletismo Amador, com o objetivo de resolver pendências e regular as disputas. O Comitê Olímpico Internacional (COI) já existia desde 1894, mas ele não supervisionava esse tipo de problema.
Com a passagem dos anos, o caráter idealista e amadorístico da entidade foi desaparecendo. Os integrantes do comitê, na Era Coubertin, eram homens abnegados que se sacrificavam pela causa. Hoje, são cartolas que viajam de primeira classe, ficam em hotéis caríssimos e recebem a cada Olimpíada aqueles ingressos para as cadeiras vip desocupadas que você vê em tantas provas pela televisão. (Os londrinos ficaram furiosos com isso. Tentavam comprar bilhetes sem sucesso, e depois na televisão viam as melhores cadeiras vazias.)
Muita coisa mudou, desde os Jogos de Londres de 1908 – menos a negação total, absoluta, acachapante, a cada quatro anos, da frase proferida por um bispo na Catedral de São Paulo, e tomada por Coubertin.
O importante nunca foi competir.
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