Estamos cansados de saber que o transporte público pode melhorar muito no Brasil. Investir nas linhas de ônibus e, principalmente, metrô é uma necessidade gritante nas grandes capitais. Hoje tem gente que leva mais de duas horas para ir e vir do trabalho por conta das condições impróprias da rede pública de transporte.
E o que é uma solução em cidades como Londres tem se tornado um problema em São Paulo: o metrô. Mas esse problema que tem se alastrado não está relacionado com o planejamento mal feito ou com o alcance limitado das linhas subterrâneas.
Hoje, quarta-feira, 19, dois homens foram presos por abusos contra mulheres na estação da Sé. Um estava fotografando a intimidade de uma moça e o outro apalpou uma mulher que estava a sua frente.
Novidade? Nenhuma.
Na segunda-feira um rapaz foi enquadrado por estupro depois de agarrar uma mulher pelo braço e tentar abaixar sua calça. Antes de ser levado pelos seguranças da Linha 7 – Rubi, o moço tomou uma surra de diversos passageiros que se revoltaram com a atitude. Mais tarde ele viria dizer que, como estava muito apertado no trem, não se aguentou e fez o que fez.
Mas esses são apenas os casos que se destacam na imprensa. Nesse ano já foram registradas 17 ocorrências semelhantes na Delegacia do Metropolitano de São Paulo (DELPOM). Mas esses, também, são apenas os registros. E em São Paulo. Certamente a triste realidade se espalha por outras cidades do país e a situação é mais grave do que as notícias fazem parecer.
Conheço diversas mulheres que reclamam de abusos que sofrem no transporte público por conta da superlotação. Os caras se aproveitam da situação difícil para tirar uma lasquinha. Já que está todo mundo se ralando por ali, porque não aproveitar? Quem vai poder dizer se é mesmo um abuso ou se é apenas uma consequência da intensa aglomeração de corpos?
Não faça isso. Nunca. Jamais. Não há nada mais deplorável do que tirar proveito de uma situação como essa. Mesmo que seja algo sutil, discreto, enganoso. Manter seu corpo estagnado numa posição suspeita se você pode dar um passo para o lado, girar um pouco a cintura para evitar o contato, é abominável.
Faça tudo o que estiver ao seu alcance para que as mulheres não se sintam ameaçadas pela sua presença. Elas estão na defensiva. Sempre. Então não dê motivos para que vejam em você uma ameaça.
Outro dia uma amiga me contou que passaram a mão na bunda dela dentro do metrô. Ela não teve dúvidas: fechou a mão e deu na cara do rapaz. Cambaleando, ele ainda foi empurrado para fora do vagão por outros passageiros.
Mas quantas têm coragem de fazer algo semelhante? Em um desses casos ocorridos hoje, a vitima esperou o vagão abrir para começar a gritar que tinha sido abusada. No entanto, nem todas tomam semelhante iniciativa. Pense em quantas vão para casa calada com a humilhação de ser invadida intimamente.
É triste tentar se imaginar na situação delas. Você necessita ir trabalhar/estudar e necessita usar o transporte público. Não é uma opção – é uma necessidade. E você vai sabendo que existe a possibilidade real de um tarado se instalar no seu cangote. Não tem saída. Esse é o jogo. Você não tem opções.
Se já é triste imaginar, então o que será viver tal situação? Não sabemos, homem.
Apenas o que sabemos é que, se antes éramos nós que nos expúnhamos aos perigos do mundo aberto em busca da sobrevivência, hoje são elas que, procurando subsistir, combatem bravamente a selvageria de alguns animais espalhados pela selva de pedra.
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